//“Eparrey Oyá! Eparrey Mainha! Quando o Verde Encontra o Rosa, Toda Preta é Rainha”

“Eparrey Oyá! Eparrey Mainha! Quando o Verde Encontra o Rosa, Toda Preta é Rainha”

O samba foi morar onde o Rio é mais baiano. A Mangueira já tem seu hino para o carnaval de 2023. Lequinho, Junior Fionda, Gabriel Machado, Guilherme Sá e Paulinho Bandolim venceram na Verde e Rosa

Depois de três anos sem uma final na Quadra, com a presença das torcidas, o Palácio do Samba ficou
lotado para a grande festa da escolha do samba que cantará na Sapucaí em 2023. O enredo apresentará
as construções das visões de África na Bahia a partir de sua musicalidade e instituições carnavalescas
negras, destacando o protagonismo feminino nesse processo, e as lutas contra intolerância, racismo e
pelo fortalecimento da identidade afrobrasileira.

A obra escolhida contagiou o mangueirense desde o início das disputas e foi ovacionado após o anúncio oficial da escola, feito pela presidenta da Estação Primeira já na madrugada deste domingo, (09).

“Estou muito feliz, pois tínhamos o sonho de unir as parcerias e de fazer um samba que agradasse nossos corações, e foi isso que conseguimos realizar, coroada com esta vitória”, destaca
Lequinho, 11 vezes campeão na Verde e Rosa.

Presente na gravação do samba da parceria, a cantora baiana Margareth Menezes marcou presença na final. “É um momento muito especial para mim. Meu pai e minha mãe me ensinaram a amar a Mangueira desde criancinha, que é um reinado da nossa música brasileira, sempre exaltando a cultura da Bahia.
Só tenho que agradecer a Mangueira”, disse Margareth.

Em seu primeiro ano como comandante da verde e rosa, Guanayra Firmino exaltou a participação de trinta
sambas que se inscreveram para a disputa, o que, segundo ela, ressalta a credibilidade no trabalho
que vem sendo realizado por sua administração e a força do enredo que a agremiação apresentará no
próximo carnaval.

Na próxima folia, a Mangueira levará para a avenida o enredo “As Áfricas que a Bahia Canta”, será desenvolvido pelos carnavalescos Guilherme Estevão e Annik Salmon.

Confira o Anúncio do Samba Campeão


Vídeo originalmente publicado pela agremiação, e repostado por PUBLICANDO NEWS

Confira a Letra do Samba Campeão

Oyá, oyá, oyá eô!
Ê matamba, dona da minha nação
Filha do amanhecer, carregada no dendê
Sou eu a flecha da evolução
Sou eu mangueira, flecha da evolução
Levo a cor, meu ilú é o tambor
Que tremeu salvador, Bahia
Áfricas que recriei
Resistir é lei, arte é rebeldia
Coroada pelos cucumbis
Do quilombo às embaixadas
Com ganzás e xequerês fundei o meu país
Pelo som dos atabaques canta meu país

Traz o padê de exu
Pra mamãe oxum toca o ijexá
Rua dos afoxés
Voz dos candomblés, xirê de orixá

Deusa do ilê aiye, do gueto
Meu cabelo black, negão, coroa de preto
Não foi em vão a luta de catendê
Sonho badauê, revolução didá
Candace de olodum, sou debalê de ogum
Filhos de gandhy, paz de oxalá
Quando a alegria invade o pelô
É carnaval, na pele o swing da cor
O meu timbau é força e poder
Por cada mulher de arerê
Liberta o batuque do canjerê

Eparrey Oyá! Eparrey Mainha!
Quando o verde encontra o rosa
Toda preta é rainha

O samba foi morar onde o rio é mais baiano
O samba foi morar onde o rio é mais baiano
Reina a ginga de iaiá na ladeira
No ilê de tia Fé, axé, Mangueira!

Confira a Sinopse do Enredo

Enredo: “AS ÁFRICAS QUE A BAHIA CANTA”

Sinopse

Quando o verde se derrama em rosa pela avenida, o céu se agita, o morro mostra seu samba como Ilú a
repicar. Os ventos se assanham no girar da mãe, conduzindo os filhos de Mangueira a desfilar. Por nós,
Oyá! Por nós, Oyá!

Ela que veio de longe. Ela que veio do vento, guerreando contra todo sofrimento, de quem um dia foi
obrigado a traçar um novo destino além-mar. Bantu, Haussá, Gegê, Iorubá…tantas Áfricas que na Bahia
vieram a aportar.

Na alma, carregaram a bagagem de seus ancestrais; no corpo estamparam a riqueza de seus rituais. No
ecoar de suas vozes, fizeram-se mais fortes, nos “batuques” e seus toques adornavam outros nortes.
Na terra de todos os santos, tantas Áfricas se recriaram pelo encanto de seus cortejos, pelas histórias
de seus cantos. Como bandeira de luta, como conquista das ruas, por liberdade em ser, por respeito às
suas. Tudo isso através dos dias onde a Bahia é mais Bahia e ser preto é sinônimo de alegria.

​Hoje, mais uma vez, iaiá mandou ir à Bahia, em tempos em que a Lei Áurea tão sonhada não havia sido
assinada, mesmo que a liberdade, posteriormente, ainda fosse ilusão. Negros iam as ruas em dia de
folia, desafiando toda perseguição, entoando cantares nativos, contando a saga daqueles que,
infelizmente, sucumbiram pela escravidão.

Faziam festa para a sua preta rainha em forma de cucumbis, trazendo, a frente, um cortejo de rotins,
afugentando todo mal que pudesse estar por ali. O arauto negro anunciava a chegada da procissão,
cavalarias faziam guarda e “barbeiros” davam o ritmo com xequerês, caxambus e a marcação. Fogos dos
bengalas explodiam no céu, quando, de repente, o filho da rainha morria em meio a exibição. Ela ordena
ao um feiticeiro que seu filho reviva. Na sua dança mágica, o menino ganha vida, ela lhe entrega
tesouros em missangas para que o cortejo prossiga, o sagrado demonstra seu poder e a corte se unifica.

​O “charme” da liberdade no papel, posteriormente, se garantia, porém a negritude estava longe de
alcançar direitos e cidadania. Pelas ruas de Salvador se viam ex-cativos marginalizados, perseguidos
até pela forma em que se vestiam. Era proibido “ser” africano na Bahia, mas, em dias de folia, a
fantasia era ousada, com muita sabedoria se esquivavam da chibata da polícia que insistia em esquecer
em que tempo estava. Seguindo a tradição preta de cortejos, se organizaram em Clubes Negros, a
disputar as ruas com a burguesia, em forma de arte, protestavam contra os açoites e a serventia.
As “Embaixadas” africanas impressionavam pelo luxo e incomodavam até que um dia foram vetadas…

Mesmo perseguidos, os préstitos viraram formas de sobrevivência e luta por liberdade. Atraia-se,
daquela forma, os olhares da imprensa e da comunidade e, na ótica do opressor, uma ignorante sensação
de “civilidade”, ao acharem possível, desta maneira, controlar a força negra da baianidade. Mas nada
era mais intenso que a união do gueto, a rua e a fé, andando a pé pela cidade. Do terreiro do Engenho
Velho, o céu dos orixás intervia ao unir a arte, a religiosidade e a fantasia, levando os livres
toques de ijexá pelas ladeiras e avenidas. Preparava-se o padê para que Exu mensageiro fosse ligeiro
abrir os caminhos para passar o Afoxé. Nessa cidade em que todo mundo é d’ Oxum, nas ruas rodam
candomblés, conduzidos e protegidos pela Yalotim, onde o santo é representado, esculpido pelo talhar
do Iroko. A África, desta vez, se recria pelas mãos do sagrado.

​A dor que pariu Salvador, pariu seu carnaval e promoveu a explosão de grupos pretos que tomaram conta
dessas vias de clave e Sol com alegria, pois ela é a revolução. A realidade dura dos guetos virava
letra de canções, incorporando e renovando a herança rítmica das negras procissões. Corpos e corpas
se tornaram protesto, estampando seu manifesto no vestir e no dançar. Os blocos afros reconstruíram
a identidade de um povo, que passa a ter ainda mais orgulho de sair na folia a cantar, de fazer a
terra tremer, pois o vulcão da Bahia é tambor de Ilê Aiyê. É pulsação de Muzenza, de Olodum e Badauê. É o Didá e dança de Malê Debalê. São as mais belas das belas deusas do ébano girando e reinando pela avenida, ao toque da batida que vira sinônimo da própria vida. Se adornam no laço afro que amarra o legado de seus ancestrais, dando cor, energia e vigor aos carnavais. Que bloco é esse, negão?

​Salvador se agita no negro toque do agogô, nas quebradas com a pele pintada, nas estampas de faraós,
na pipoca do trio, nos tambores do Pelô. Na mistura do Timbalada, dos sambas de roda, reggae e tantos
sons que dão o tom à baianidade Nagô. Nas vozes das pérolas negras que conduzem os cortejos sem
submissão de raça, sem lágrima, nem dor. O amor do povo que se lava com a força do axé, na fé do
Bonfim, nos cantos do candomblé. Axé que canta e amarra em seus fios de conta a importância de ser
chão africano. Axé da negrada que passa o astral da avenida todo ano. Axé que mostra que a cor dessa
cidade é a mesma de Mangueira, com a força do vento, expressão da liberdade, fazendo o negro respirar
felicidade.

Texto: Guilherme Estevão e Annik Salmon

Pesquisa: Guilherme Estevão, Annik Salmon e Mauro Cordeiro.

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